«Para mim, o meu bem é estar perto de Deus» (SI 72, 28).
I. O desprendimento de todos os bens criados e de si mesmo, permite que a criatura compreenda mais profundamente a ação divina. «O Senhor te chamou como uma mulher abandonada e angustiada..., diz o Senhor teu Deus. Por um momento eu te abandonei, mas, no meu grande amor, volto a chamar-te» (Is 54, 6-7).
Depois de ter castigado Israel pelas suas infidelidades, o Senhor voltou a chamá-lo a Si, restituindo-lhe os Seus favores; o mesmo acontece após a purificação das almas em aflições, em aridez e abandono: atrai-as «com imensa compaixão» para as unir a Si. Esta atração divina realiza-se na contemplação, que, como diz S. João da Cruz, «é ciência de amor, notícia amorosa infusa de Deus, e que juntamente ilustra e enamora a alma até a fazer subir, degrau a degrau, até Deus, seu Criador. Porque só o amor é que une e junta a alma com Deus». Ao princípio, isto acontece de modo impercetível à criatura, mas, depois, esta sente «de ordinário esta inflamação e no calor de amor». São, então, momentos de grande gozo, pelo qual a criatura só busca a união com Deus, gozo que a recompensa amplamente de todas as dores e ânsias sofridas na escuridão da noite.
«Encontrei aquele a quem a minha alma ama: agarrei-me a ele e não o largarei mais» (Cant 3, 4). Nesses momentos, a presença de Deus na alma não é apenas uma verdade de fé em que se acredita firmemente, mas uma realidade divina intensamente experimentada. A cria-
tura adverte que está em Deus, e sente-O em si numa presença mais viva do que qualquer outra presença criada. São experiências de divina união que Deus concede «quando quer e como quer e a quem quer» (S. Teresa de Jesus, Moradas IV, , 2), e que, mesmo tendo raras
e breves, fazem com que a criatura se firme n'Ele e animam-na a abraçar, de boa vontade, todos os sofrimentos que tiver de enfrentar até chegar a união perfeita.
No entanto, é preciso lembrar sempre que o amor não consiste no gozo que se possa experimentar, mas, na decisão enérgica da vontade em dar-se a Deus. É o Senhor quem tudo faz e Ele pode infundir o amor «deixando seca a vontade» (Noite Il, 12, 7), ou então,
inflamando-a com suave ardor.
II. «O amor - diz S. João da Cruz - é a inclinação da alma e a força e a virtude que ela tem para ir a Deus...;e assim, quantos mais graus de amor tiver, tanto mais profundamente entra em Deus e se concentra n'Ele». O amor imperfeito só pode produzir uma união imperfeita, enquanto que o amor perfeito gera uma união perfeita: «o amor mais forte é mais unitivo». «Para a alma estar no seu centro, que é Deus - explica S. João da Cruz -, basta que tenha um grau de amor, porque por um só se une com Ele pela graça».
Mas só aquele que possui o mais elevado grau de amor se unirá a Deus «até ao seu último e mais profundo centro». O amor é o peso que arrasta o homem para Deus, em proporção com a sua força. Mas, também é verdade o contrário: isto é, que o amor atrai Deus à Sua criatura. «Se alguém Me ama, guardará a Minha palavra; Meu Pai amá-lo-á e viremos a ele e faremos nele morada» (Jo 14, 23). Basta um amor inicial, que consiste na observância da lei divina, para garantir o estado de graça e, por isso, a presença de Deus na alma dos crentes que vivem já em união com Deus que mora neles. Trata-se, no entanto, duma união muito imperfeita. Antes de chegar à união íntima, à comunhão plena, fica um longo caminho a percorrer, cujas etapas estão assinaladas pelo progresso no amor; quanto mais a alma ama, tanto mais se abisma em Deus; e, por outra parte, o próprio Deus, realizando a Sua promessa, torna-Se cada vez mais presente pela graça, convidando-a a uma amizade e a uma união mais íntima.
O amor realiza este prodígio: atrai Deus para o homem que O ama e projeta o homem para Deus; pelo amor, uma simples criatura, que por si mesma é nada, encontra-se com o seu Criador e une-se a Ele tão íntima e perfeitamente que fica totalmente transformada e divi-
nizada: «Chegará a ferir a alma..., transformando-a e esclarecendo-a segundo todo o ser e potência e virtude da alma, segundo ela for capaz de receber, até a fazer uma semelhança de Deus». É isto o que faz o amor, porque não é mais do que uma participação da caridade infinita, que é Deus. «Deus é amor» (1 Jo 4, l6): por isso, onde há amor, aí habita Deus; «quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele».
Senhor, participo-Te o meu gozo e confiança; estou amparado pelo Teu amor, a ele me abandono, nele me perco... Ó amor imenso do meu Deus! Como poderei amar-Te de ricochete?... Não tenho nada para Te oferecer a não ser os Teus dons, que saem das minhas mãos excessivamente gastos e mutilados...
Ó bondade, inesgotável ternura, ó pai e mãe ao mesmo tempo, ó amigo fiel e gozoso, ó esposo apaixonado e zeloso, ó irmão que aconselhas e orientas, ó rio profundo e sereno, fogo que abrasa e luz que dá a luz, ó Pai meu tudo, ó Amor ao qual depressa regresso, ó Amar, espera por mim: eis-me aqui!
Tudo é divino. Nada é profano... Deus, meu Pai, Deus, meu amigo, terníssimo e providente... Deus mais doce do que uma mãe (P. Lyonnet, Escritos espirituais).
Deus meu, entrega-Te a mim. Eis que eu Te amo e, se for pouco ainda, que Te ame com mais energia. Não posso medir o que ainda me falta de amor, para que seja suficiente, para que a minha vida corra entre os seus abraços e não me afaste até que me esconda no oculto do Teu rosto. Só isto sei: que estou mal longe de Ti, não somente fora de mim, mas ainda em mim mesmo; e que toda a minha abundância que não for o meu Deus, é indigência. O meu Peso é o amor. Para qualquer parte que vá, é ele quem me leva.
O Teu Dom nos inflama e nos arrebata para o alto; abrasa-nos e partimos. Fazemos ascensões no coração... É o Teu fogo, o Teu fogo bem facejo que nos consome, e nós vamos, nós subimos para a paz da Jerusalém celeste (S. Agostinho, Confissões, XIII, 8:9. 9.10).
Senhor, és bom para a alma que Te procura. Como serás, então, para a alma que Te encontra? Está precisamente aqui a maravilha: ninguém pode procurar-Te se antes não Te tiver encontrado. Queres, pois, ser encontrado para ser procurado e queres ser procurado
para ser encontrado novamente. Sim; bem podes ser procurado e encontrado, mas não nos podemos adiantar a Ti. Embora digamos: Pela manhã a minha oração irá ao Teu encontro, não há dúvida que será tíbia toda a oração que não tenha sido precedida da Tua inspiração.
Este deve ser somente o desejo do nosso coração: permanecer em Deus. Nada mais é importante do que isso.
Quanto mais a alma se entregar, tanto mais de dará Deus à ela.
Quanto mais se decidir por Deus, muito mais santa será a alma e menos pecadora se tornará.
Eis aqui a grandeza do nosso ser: ser inteiramente de Deus.
Para isso existimos e para essa finalidade, pois que, sendo de Deus, na perfeição de vida, seremos íntimos Dele em toda a essência e melhor viveremos, pois seremos plenos em tudo.
Incansavelmente O busquemos e deixemos que Ele firme em nós as virtudes e dons de que carecemos.
Como é feliz a alma que á Ele se entrega e ama...Nada lhe falta!
Finalização de Claudia Pimentel dos Conteúdos Católicos
Outros artigos que podem ser do seu interesse:
Comentários