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A Virtude da Prudência - Parte 2



III. SEGUNDO PASSO: O JUÍZO MORAL


1. O juízo da consciência


Navegamos bem pela vida quando a nossa alma - como diz o verso antes citado de Claudel - é norteada pela prudência. Mas já vimos que a prudência só é virtude se sabe «discernir o nosso verdadeiro bem» (Catecismo, n. 1806).


Ora, quem vai nos dizer qual é o nosso «verdadeiro bem»? Quem deve julgar sobre a qualidade moral - boa ou má - das nossas ações?


A resposta é: - A consciência.


O Catecismo fala assim da relação entre a prudência e a consciência: «É a prudência que guia imediatamente o juízo da consciência. O homem prudente decide e ordena a sua conduta segundo este juízo».


Estamos perante um ponto delicado e muito importante da virtude da prudência.


Para não nos desviarmos da rota do nosso pensamento, nos ajudará prestar atenção desde já à definição de consciência que dá o Catecismo: «A consciência moral é um julgamento da razão pelo qual a pessoa humana reconhece a qualidade moral de um ato concreto que vai planejar, que está a ponto de executar ou que já praticou. Em tudo o que diz e faz, o homem é obrigado a seguir fielmente o que sabe ser justo e correto» (n.1778).


Com base nessa ideia, vamos prosseguir, começando por focalizar um "caso" difícil.


2. Uma página desconcertante do Evangelho


Uma das páginas mais difíceis do Evangelho é a parábola em que Jesus elogia um sem- vergonha, um administrador desonesto de quem o patrão começava a suspeitar (Lc 16, 1-8).


Para evitar ser dispensado e ficar na rua, o corrupto vai chamando um a um os devedores do seu patrão e os induz a falsificar junto com ele as contas, reduzindo-lhes as dívidas à metade ou quase: - Quanto deves ao meu senhor? - Cem barris de óleo. - Pega a tua conta, senta-te, depressa, e escreve: cinquenta.


É óbvio que Cristo não aprova a corrupção nem a mentira. O que Jesus pretendeu com essa história chocante foi mostrar que os que vão atrás do mal - e pecam, e cometem crimes - muitas vezes agem com mais esperteza do que os cristãos que procuram fazer o bem. O senhor elogiou o administrador desonesto, "porque agiu com esperteza". De fato, os filhos deste mundo são mais espertos em seus negócios que os filhos da luz.


O grande negócio dos filhos da luz, dos filhos de Deus, é aspirar à perfeição do amor, até atingirem o que São Paulo chama a estatura da maturidade de Cristo (Ef 4, 13), e - unidos a Cristo - espalhar o amor e o bem à sua volta. Mas, na realidade, muitos cristãos, acomodados e passivos, tem bem menos fibra para o bem do que muitos bandidos para o mal. Parecem abobalhados ao lado desses espertos.


A moral cristã chama "astúcia" à falsa prudência do administrador infiel. A astúcia é o arremedo diabólico da prudência, que faz com que haja chefes do crime organizado mais eficientes do que os governantes legítimos; que haja quem, com pouco esforço e despesa, tire ótimos lucros vendendo aparelhos falsificados ou celulares roubados; que hackers sem escrúpulos roubem eficientemente milhões, entrando em inúmeras contas bancárias com vírus quase impercetíveis.


«Existe uma falsa prudência - diz são Josemaria -, que devemos chamar antes de astúcia, que está ao serviço do egoísmo, que se serve dos recursos mais adequados para atingir fins tortuosos».


São João Paulo II comenta: «Prudente não é - como muitas vezes se julga - o que sabe virar-se na vida para dela tirar o máximo proveito, mas o que consegue edificar a vida inteira de acordo com a voz da consciência reta e as exigências da moral justa».


3. "A voz da consciência reta"


Acabamos de ver que a virtude da prudência deve julgar as nossas ações mediante um juízo de valor formulado pela consciência: "Isto está certo, isto está errado" - "Isto é virtude, isto é pecado".


Será que a nossa consciência sempre julga bem? Não pode enganar-nos? Qual é a luz verdadeira com a qual a nossa consciência tem que julgar? Qual é o referencial que

garante o acerto da consciência?


É um fato que a nossa consciência muitas vezes nos engana. «Colocada diante de uma escolha moral, a consciência pode emitir um julgamento correto de acordo com a razão e a lei divina ou, ao contrário, um julgamento errôneo que se afasta delas» (Catecismo, n. 1786).


A consciência pode errar, isto é, pode achar correta uma solução desonesta.


Para evitar esses erros é necessário ter muito em conta que a nossa consciência não cria a moralidade - a bondade - dos nossos atos. Muitos acham que basta que a "sua consciência" aprove algo para que isso fique sendo certo. Transformam assim a sua "convicção" subjetiva, não autenticada por uma verdade objetiva, num "deus" que sempre acerta e que deve ser acatado contra tudo e contra todos; e a esse falso "deus" chamam "a minha consciência".


É indispensável, por isso, não perder de vista que só a consciência bem formada «formula seus julgamentos segundo a razão, de acordo com o bem verdadeiro querido pela sabedoria do Criador» (Catecismo, n. 1783). Somente assim a consciência é «a voz

de Deus» e não a voz de uma ilusão, das conveniências ou da fantasia.


4. Em sã consciência


É muito sábia a língua portuguesa quando usa a expressão "em sã consciência, eu

penso que...", porque - como estamos vendo - a nossa consciência pode estar sã ou

doente.


Veja como São João Paulo II fala da sã consciência: «Deus, que é o único bom (Mt 19, 17), conhece perfeitamente o que é bom para o homem, e, devido ao seu mesmo amor, o propõe nos mandamentos».


Esclarecida pela luz dos mandamentos, dos preceitos e dos conselhos divinos, a consciência torna-se canal da voz de Deus. Um exemplo: toda a doutrina católica sobre a vida, que São João Paulo II expõe magnificamente na encíclica Evangelium vitae ("O evangelho da vida"), tem como alicerce - para iluminar verdades, erros e confusões - o quinto mandamento da lei de Deus: Não matarás.


«Os preceitos morais negativos - diz - têm uma função importantíssima: o "não" que exigem incondicionalmente aponta o limite intransponível abaixo do qual o homem livre não pode descer, e simultaneamente indica o mínimo que ele deve respeitar e do qual deve partir para pronunciar inumeráveis "sins", capazes de cobrir progressivamente todo o horizonte do bem, em cada um dos seus âmbitos» (n. 75).


Em 1833, o futuro cardeal Newman, cada vez mais próximo da sua conversão ao catolicismo, escrevia durante uma estadia na Sicília, o seguinte verso: «Eu antes gostava de escolher e compreender o meu caminho. Agora, pelo contrário, eu oro: Senhor, guia-me Tu».


Bento XVI comentava essa atitude de Newman: «O específico do ser humano, enquanto ser humano, não consiste em interrogar-se a si mesmo sobre o "poder" (o que eu posso fazer), mas sobre o "dever" como abertura da alma à voz da verdade e das suas exigências (...). O jugo da verdade é "leve" (Mt 11,30), dado que a Verdade - Jesus - veio, amou-nos e queimou as nossas culpas no seu amor. Só quando conhecemos isso e o experimentamos interiormente é que somos livres pra escutar com alegria e sem ansiedade a mensagem

consciência».


V. AINDA SOBRE O JUÍZO DA CONSCIÊNCIA


1. Há luzes falsas


Como víamos, somente a consciência guiada pela luz de Deus formula juízos morais corretos: os únicos que nos permitem ser prudentes. Vamos aprofundar um pouco

mais nesse tema.


São muitas as luzes falsas que tiram a consciência dos trilhos e falsificam a bondade das nossas ações. Jesus nos alerta: Se o teu olho - o olho da alma - estiver são, ficarás todo cheio de luz. Mas se teu olho for ruim, ficarás todo em trevas (Mt 6, 22-23).


Vem-me ao pensamento um conto de Chesterton, O fim dos Pendragon, que trata de um "almirante" louco, que morava num velho casarão nas costas rochosas da Cornualha, no sudoeste da Inglaterra. Construiu uma torre em cujo cimo podia acender uma grande fogueira, e assim simulava de longe um farol marítimo. Com essa luz falsa, enganava navegantes rivais que queria eliminar e os induzia a naufragar e morrer no labirinto das rochas.


Que "luzes" nos enganam mais facilmente? Quais os falsos faróis que nos fazem naufragar na vida moral? Vejamos alguns, mesmo que repisemos ideias já expostas ou apontadas nos capítulos anteriores.


- O farol do subjetivismo. A pessoa - já víamos isso - confunde a consciência com um sentimento subjetivo. Não nos damos conta de que o que nós "achamos" está condicionado frequentemente por vícios e influências que obscurecem a retidão moral.


Mais ainda. «Quando o homem não se preocupa suficientemente com a procura da verdade e o bem, a consciência pouco a pouco, pelo hábito do pecado, se torna quase obcecada». É a cegueira moral, a moral insanity.


«Acaba-se por assumir - dizia São João Paulo II - como única e indiscutível referência para as próprias decisões, não já a verdade sobre o bem e o mal, mas apenas a sua subjetiva e volúvel opinião ou, simplesmente, o seu interesse egoísta e o seu capricho... Diminui toda referência a valores comuns e a uma verdade absoluta para todos: a vida social aventura-se pelas areias movediças de um relativismo total. Então, tudo é convencional, tudo é negociável, inclusive o primeiro dos direitos fundamentais, o direito à vida».


- O farol do politicamente correto. É fácil ser arrastado pela correnteza do pensamento dominante. Se todo o mundo pensa assim, acha-se que aquilo tem que estar certo; ou então adere-se covardemente para ser bem aceito. Ora, a opinião "geral" - até mesmo em muitos ambientes católicos - com frequência não coincide com o que é o critério "normal", o que corresponde aos valores autênticos da vida moral.


Uma corrupção econômica ou sexual generalizada não torna esses comportamentos moralmente bons. São incontáveis os jovens e menos jovens que substituem os valores da ética natural e da moral cristã pelas falsas "liberdades comportamentais" do ambiente (abusos destemperados do sexo, do álcool, da droga, do consumismo, da pornografia, do exibicionismo e da mentira nas redes sociais), e acham que isso é "normal". É a moral que transforma em valores os erros estatisticamente majoritários.


Vale a pena transcrever umas palavras do conhecido filósofo espanhol Julián Marías: «O homem da nossa época recebe uma série de interpretações da realidade que, muitas vezes, têm um caráter moral. Aparecem formas de vida, de relacionamento humano, de família, de ética política que são, de certa forma, interpretações a uma determinada luz e, muitas vezes, apresentam-se como normais só porque são frequentes.

Essa identificação parece-me muito perigosa: considerar o que é frequente como normal, o que é normal como lícito, e o que é lícito legalmente como se fosse moral. Não! Trata-se de identificações inaceitáveis. Pode haver coisas frequentes que não são normais, e pode haver coisas lícitas legalmente, mas que não o são moralmente. É preciso analisar cada caso concreto».


- O farol das ideologias. É uma falsa luz muito aparentada com a anterior. Hoje, a influência do ambiente, a pressão dos média, o tom doutoral e agressivo dos militantes das ideologias em pauta é uma pirotecnia de luzes enganadoras, que pretendem dominar monoliticamente o pensamento de todos. Muitos despreparados caem nessa tirania como a mariposa que queima as asas na chama de uma vela: desde o velho marxismo até o laicismo antirreligioso, passando pelo niilismo e as antropologias antinaturais.


Bem dizia o Papa Bento XVI, «Cresce o perigo de uma ditadura da opinião, e quem não a acata é isolado e marginalizado, de tal forma que há gente boa que não ousa mais manifestar que não concorda com esses grupos. Uma eventual ditadura anticristã do futuro será presumivelmente muito sutil. Ela se mostrará aparentemente aberta às religiões, mas com a condição de que não mexam no seu modelo de conduta e de pensamento». São novos dogmas de fé, com a sua própria inquisição, apoiados até mesmo pela lei e os tribunais.


2. O farol que não engana


No meio desse Halloween, dessa festa das bruxas, destaca o brilho da lux vera (Jo 1,9), a luz verdadeira, única que pode guiar as nossas vidas por caminhos de bondade.


Santo Agostinho indica um rumo certo: «A prudência é o amor que sabe discernir bem que coisas nos ajudam a caminhar para Deus, e quais nos podem impedir de fazê-lo». E alerta: «Não pretendas desviar o coração de Deus, que é sempre reto, para que se acomode à perversidade do teu».


Voltemos ao Catecismo, que nos mostra o verdadeiro farol: «A consciência deve ser educada e o juízo moral esclarecido. Uma consciência bem formada é reta e verídica.

Formula seus julgamentos seguindo a razão, de acordo com o bem verdadeiro querido

pela sabedoria do Criador. A educação da consciência é indispensável aos seres humanos

submetidos a influências negativas e tentados pelo pecado a preferirem o próprio juízo e

a recusar os ensinamentos autorizados» (n. 1783).


Depois, o mesmo Catecismo (n. 1785), concretiza os modos de procurar a lux vera para, com base nela, formular os nossos juízos éticos:


- «Na formação da consciência, a Palavra de Deus é a luz do nosso caminho; é preciso que a assimilemos na fé e na oração e a ponhamos em prática». Sobretudo, com a leitura e meditação frequente - de preferência, diária - do Novo Testamento, e mais especialmente dos quatro Evangelhos.


- «É preciso ainda que examinemos a nossa consciência». Lembremos que Jesus

dizia que os puros de coração verão a Deus (Mt 5, 8). Com o exame de consciência

(bastam uns minutos de balanço espiritual à noite), identificamos as nossas falhas e

insuficiências, pedimos perdão a Deus, e nos preparamos para purificar a alma com um

propósito de retificar e, em muitos casos, com uma boa Confissão. Assim, com a alma

purificada pelo perdão de Deus, é mais difícil que nos iludamos com as luzes falsas.


- «Somos assistidos pelos dons do Espírito Santo». Não nos faltará essa luz divina para as decisões morais, se invocarmos frequentemente a assistência do Espírito Santo:

"Ó luz felicíssima, enchei o mais íntimo dos corações dos vossos fiéis", diz a sequência de

Pentecostes Veni, Sancte Spiritus.


- «Somos ajudados - diz ainda - pelo testemunho e conselho dos outros». Ajuda-nos muito frequentar um confessor fixo, com quem possamos ter direção espiritual.


- «Somos guiados pelo ensinamento autorizado da Igreja». O Catecismo da Igreja Católica, na sua edição típica vaticana, é uma fonte de claridade para as dúvidas e ignorâncias da nossa consciência. Basta consultar o assunto em questão no amplíssimo e excelente índice alfabético que, como um dicionário remissivo, se encontra no final do volume.


Nestes tempos de confusão e opiniões morais conflitantes, mesmo no âmbito católico, é importante ter presente o que São João Paulo II dizia sobre esse Catecismo:


O Catecismo da Igreja Católica é «norma segura para o ensino da fé..., texto de

referência seguro e autêntico para ensino da doutrina católica... É oferecido a todos os

fiéis que desejam aprofundar o conhecimento das riquezas inexauríveis da salvação».


V. O JUÍZO SOBRE OS MEIOS


1. Julgar e preparar os meios


Comecemos recordando uma citação de Santo Tomás: «É próprio da prudência deliberar, julgar e ordenar os meios para se chegar ao fim devido». Em sintonia com o santo doutor, Josef Pieper escreve que «o caráter próprio da prudência é o comprometimento no campo dos meios e dos caminhos, no campo das realidades concretas».


E importante discernir os «caminhos verdadeiros», ou seja, os meios apropriados para alcançar a meta proposta, porque a prudência - insistimos - é uma virtude prática: julga sobre a maneira adequada e eficaz de fazer algo.


Jesus mostra a importância dos meios com uma parábola simples:


Se algum de vós quer construir uma torre, porventura não se senta primeiro para calcular os gastos, para ver se tem o suficiente para terminar? Caso contrário, ele vai pôr o alicerce e não será capaz de acabar. E todos os que virem isso começarão a zombar:

"Este homem começou a construir e não foi capaz de acabar!" (Lc 14, 28-30).


Esse planejador tinha uma meta honesta: edificar uma torre. Começou por refletir:

sentou-se para pensar. Mas descuidou frivolamente o juízo sobre os meios: não calculou

se tinha o suficiente. E o projeto ficou truncado.


Todos conhecemos casos parecidos de fracassos em empreendimentos comerciais, industriais, imobiliários, agrícolas, familiares, etc.


Vejamos uma história atual: - Após o aviso prévio, chegou o momento de o protagonista desta história se achar na rua. Já vinha cismando sobre a possibilidade de um novo trabalho. De repente, uma ideia despontou na mente: "O fundo de garantia! Posso aplicá-lo na criação de uma pequena empresa". Mas qual empresa? Sempre trabalhou como engenheiro no ramo da construção civil. "As pessoas comem - disse de si para si -, as pessoas são gulosas"; e, com embalo poético, resolveu montar uma doceira.


- Já tinha trabalhado em alguma? Não. Tinha experiência de fabricação de doces?

Nenhuma. "Mas tenho um amigo, possível sócio, que trabalhou um tempo nesse ramo da

alimentação, ele conhece". Tão pouco o conheciam ambos que, após oito meses, o fundo

de garantia estava queimado e a doceira fechada. Para maior desgraça, a rua onde abriram o negócio tinha fama de ser um "cemitério de fundos de garantia".


Nessa história precisamos enxergar algo mais que uma incompetência profissional.

Temos que considerar a imprudência grave que decorre - em todos os campos - da nossa

falta de preparo pessoal.


No "juízo sobre os meios", o meio principal a se ter em conta é a própria pessoa que faz ou empreende: as suas qualidades, os seus conhecimentos, a sua competência, a sua experiência, as suas capacidades. Muitas das piores imprudências procedem de descuidar o devido "preparo da pessoa"; e, infelizmente, é para as coisas mais importantes da vida que se descura esse preparo.


Vamos meditar sobre duas delas a título de exemplo. Vou me alongar propositadamente neste ponto, pois acho que vale a pena.


2. Imprudência no casamento


Por que fracassam tantos casamentos? Não pretendo citar as principais causas, mas só algumas básicas, decorrentes da falta de prudência. Pode ilustrar isso uma parábola do Evangelho.


Na parábola das "dez virgens" - como é tradicionalmente designada - Jesus focaliza um costume dos casamentos da época. Um grupo de moças, amigas da noiva, iluminavam à noite o cortejo nupcial. Para tanto, cada uma trazia uma lâmpada de óleo, mais uma pequena vasilha de reserva.


Na parábola que agora evocamos, as moças eram dez: cinco sensatas e cinco avoadas. Essas últimas, ao tomarem as suas lâmpadas, não levaram consigo o óleo de reserva. Como é de praxe, os noivos se atrasaram, e todas as moças começaram a cochilar. À meia-noite ouviu-se um brado: "Aí vem o esposo, ide ao seu encontro!"

Despertaram todas e aprontaram as lâmpadas. As imprudentes disseram às sensatas:

"Dai-nos do vosso óleo, que as nossas lâmpadas se apagam". Mas não havia o suficiente.

Tentaram comprá-lo mas, quando regressaram, a sala do banquete já tinha as portas trancadas. Bateram e não foram aceitas: Não conheço vocês, respondeu uma voz lá

dentro (Mt 25, 1-12).


Que lhe diz essa parábola? É o retrato das pessoas que sonham, que vibram com seu sonho - pensemos concretamente no casamento -, que preparam, longa e cuidadosamente tudo o que é material e secundário, como as cinco moças insensatas prepararam vestido e penteado, mas se esquecem de aprontar o imprescindível. Quando chega a hora sonhada, encontra-as sem chama, sem luz. Ficam no escuro e nele se perdem. Poucos anos depois do casamento não sabem mais o que querem nem aonde vão parar.


A conclusão é clara. Não basta a boa vontade, a emoção, o sentimento, etc. etc.,

para que o amor amadureça e dure. Além da formação espiritual e da graça de Deus, é

preciso, no mínimo, preparar-se:


- cultivando a amizade entre os dois. Se, no namoro e no noivado, eles só cultivam paixão, prazer e planos gostosos, não se conhecem; enganam-se com carinhos, festas, arrebatamentos e fumaças coloridas.


O namoro cristão é sábio: valoriza o mútuo conhecimento e a reflexão serena muito acima da paixão. Por isso, eu lhes diria: "Não façam como os namorados que se atiram estupidamente à embriaguez sensual. Vivam a castidade, delicada e sacrificada, que valoriza e torna o amor mais firme e estável, e não o reduz a um bem de consumo, que se gasta e pouco depois se joga fora".


- "Dediquem mais empenho e mais tempo a conversar - diria também - , a trocar ideias, a conhecer bem o pensamento um do outro - para perceber se é superficial, vazio, frívolo, egoísta; ou é idealista, profundo, generoso, disposto ao sacrifício necessário para construir um ideal de família e de amor verdadeiro ... - ; dediquem tempo a planejar juntos essa construção (tijolo a tijolo!), sem ansiedade nem pressa afobada, degrau a degrau, doação a doação, renúncia a renúncia, aprendendo a achar a sua maior alegria na alegria que procuram dar ao outro..."


- Além disso (que não passa de uma síntese parcial e breve), procurem adquirir uma formação sólida sobre o matrimônio e a família. Não bastam breves cursos de noivos

de fim de semana. Fazem falta semanas e meses de leitura, estudo e preparo sistemático,

contando com o aconselhamento de casais experientes e exemplares. Há entidades

dedicadas à família, que já oferecem cursos de alto padrão e eficiência.


- Não digam que não têm tempo, porque isso de "não ter tempo" é uma história da carochinha. Não é questão de tempo, mas de vontade, de "querer". E esforcem-se

para que nunca se lhes possa aplicar aquela sentença desoladora: «Viveram sem se

conhecerem, e morreram sem se amarem».


3. Imprudência na formação dos filhos


Muitas das atitudes que acabamos de mencionar aplicam-se - com a mesma força

e urgência - à formação dos filhos.


Todos os pais desejam que os filhos sejam "bons", que não sejam arrastados pelo aluvião de desordem, desorientação e vícios, que parece sequestrar boa parte da nossa juventude.


Não pretendo fazer aqui uma exposição sobre educação dos filhos. Limito-me a conclamar os pais a terem a prudência de não confundirem os filhos com anjinhos ou com couves. Sim, isso mesmo.


- "Anjinhos" não são. Todos nascemos com "uma gota do veneno da serpente do Paraíso", como dizia Ratzinger, ou seja, com as tendências e os puxões dos sete vícios capitais: orgulho, avareza, luxúria, ira, gula, inveja e preguiça. Não empenhar-se em educar a sério as virtudes dos filhos - dentro de um clima de dedicação amiga, de exigência e de liberdade acompanhada - equivale a deixá-los prisioneiros dos sete tentáculos desse polvo dos vícios capitais.


- Também não confunda filhos com "couves", que podem crescer sozinhas, e mal, em qualquer terreno baldio. Não vão se formar por si mesmos, nem basta o melhor colégio, se os pais não assumem "pessoalmente" a tarefa de educá-los (além de garantir- Ihes escola, faculdade, saúde, etc.). Concretamente, assumam:


• A tarefa de formar-lhes o caráter, de formá-los nas virtudes humanas (fortaleza, justiça, temperança, desprendimento, respeito, compreensão...).


• A tarefa de formá-los na caridade, na vitória sobre o egoísmo grande ou pequeno. Isso é importante! Façam tudo para que abram o coração às necessidades do próximo -começando pelos irmãos, se tiverem - e não fiquem fechados em si mesmos.


• Especialmente, ponham empenho em formá-los na fé, nos valores morais perenes do Cristianismo e na prática cristã. Leiam juntos, rezem juntos, expliquem-lhes a Doutrina.


Reparem que muitos pais, com as suas omissões na educação dos filhos, são como o tal terreno baldio onde os filhos crescem como couves mirradas e bichadas, como mato que a vida se encarregará de queimar.


- Ninguém nasce sabendo formar filhos, menos ainda numa sociedade de confusões, ameaças, naufrágios e fogos cruzados de ideologias como é a atual. Nos tempos atuais, é preciso preparar-se bem para essa grande tarefa.


"Preparar-se" não é recusar-se a ter filhos ou ter apenas um por medo dos perigos desse mundo. É dar o máximo para proporcionar-lhes os meios de formação moral e espiritual adequados - mais necessários do que o pão que comem - e para que sejam assim o que Deus quer deles: bons filhos de Deus, protagonistas da grande aventura de um futuro melhor.


- Mais umas poucas palavras, agora sobre a liberdade dos filhos. Perante a liberdade mal formada e mal acompanhada que os pais dão muito cedo aos filhos, caberia perguntar-se se isso consiste realmente em deixá-los livres, ou em livrar-se deles e jogá-los às feras. Uma liberdade sem norte equivale a um suicídio programado. Que cada pai e mãe se perguntem sinceramente como praticam a prudência neste ponto crucial.


- E ainda mais uma consideração, bem importante nos nossos dias: é preciso aprender a arte de corrigir os filhos. É uma das prudências mais elevadas. Seleciono aqui apenas algumas breves sugestões de São Josemaria para os pais e formadores:


Quando se vê a necessidade de corrigir, é preciso «contar antecipadamente com o desgosto alheio e com o próprio, se desejamos de verdade cumprir santamente as nossas

obrigações de cristãos... Não esqueçais que é mais cômodo - mas é um descaminho -

evitar a todo o custo o sofrimento, com a desculpa de não desgostar o próximo.

Frequentemente, esconde-se nessa inibição uma vergonhosa fuga à dor própria, já que

normalmente não é agradável fazer uma advertência séria. Meus filhos, lembrai-vos de que o inferno está cheio de bocas fechadas».


«Que nenhuma razão hipócrita vos detenha: aplicai o remédio nítido e certo. Mas procedei com mão maternal, com a delicadeza infinita com que as nossas mães nos curavam as feridas grandes ou pequenas dos nossos jogos e tropeções infantis. Quando é preciso esperar umas horas, espera-se; nunca mais que o imprescindível, já que outra atitude encerraria comodismo, covardia, que são coisas bem diferentes da prudência.

Todos nós - e principalmente os que se encarregam de formar os outros - devemos repelir o medo de desinfetar a ferida».


Vimos esses dois exemplos práticos com certa extensão. Sirva isso como apelo para não ficarmos com ideais gerais ao exercitar a prudência.


Continua...















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