O Que é Acídia?
A acídia é uma tristeza, um enfado, um torpor de mente, uma tal fraqueza de ânimo, que afasta a vontade de fazer ou de começar alguma obra boa. E isto acontece justamente nas coisas espirituais, nas quais estão apoiadas a honra de Deus e a salvação do próximo. Para essas coisas o acidioso prova aversão. A acídia se contrapõe à alegria espiritual, que nasce do amor e se compraz somente em Deus e nas coisas divinas.
As Filhas da Acídia:
Segundo São Gregório Magno as filhas da acídia são:
- Malícia, isto é, enfado pelos bens espirituais;
- Irascibilidade, indignação contra quem a encaminha ou procura persuadi-la a fazer o bem;
- Medo, para o qual não se aceitam os remédios indicados, que parecem bastante lentos no agir;
- Desespero, desânimo geral, acha impossível atingir o fim e então não se empenha minimamente;
- Indolência, fadiga e cansaço em observar os preceitos;
- Evasão para as coisas ilícitas: afasta-se das coisas espirituais, depois surge o tédio e então se entrega aos prazeres dos sentidos e do mundo.
A estas se podem relacionar todas as outras manifestações de acídia:
- tepidez; busca dos prazeres; sonolência; ociosidade; contínuo adiamento da conversão e do início do bem; lentidão em prosseguir a obra iniciada; negligência no empenho:
- que as coisas sejam feitas bem ou mal pouco importa, desde que se livre do peso do cansaço; abulia ou desânimo, que faz ir de mal a pior; dissolução ou portar-se sem controle; descuido ou superficialidade, isto é, deixar de cuidar de si mesmo, das pessoas, das coisas temporais; desleixo ou indolência, isto é, a estultícia em preferir ficar na miséria, para não se empenhar; falta de profunda vida de oração ou secura espiritual; enfado da vida, que surge de um longo descontentamento em fazer o bem; amargura (esta também deriva da tristeza); desatino mental; tagarelice excessiva; curiosidade e inquietação de corpo e de mente.
- À malícia está ligada a tristeza ou a falta de alegria no serviço divino;
- à irascibilidade, a amargura;
- ao medo, a busca dos prazeres; o adiamento, a tepidez e a lentidão;
- ao desespero, o enfado de vida;
- ao desânimo, a sonolência; a abulia, a dissolução; a preguiça, o descuido ou a superficialidade; a indolência, a negligência;
- à evasão, a dissipação; o desatino, a curiosidade; a tagarelice excessiva, a inquietação e a inconstância.
Origem e Consequências da Acídia:
"Amor próprio, negligência e desobediência".
Destacamos que a primeira, a mais remota e obscura origem do mal seja a soberba. Agora vejamos como ela se torna negligência, ou seja, aquela série de rápidas e insensíveis quedas, com a qual se caminha sem parar até seu desfecho, isto é, a visível queda: a desobediência. Esta é a causa próxima do mau êxito da vida do pastor faltoso. Essas quedas rápidas e sucessivas, em longa série, procedem todas da negligência.
A origem do mal está, pois, na soberba, a fase sucessiva é a negligência e o último passo é a desobediência.
O amor próprio, raiz da soberba, faz logo diminuir o amor de Deus; daquele deriva a negligência. A negligência não sabe amar, e se não se ama o amor ao bem se torna sempre mais fraco e se chega até ao desprezo de Deus.
Eis algumas manifestações:
- Acídia, tepidez, negligência, pouco amor do bem de Deus e do próximo.
- Perda da vigilância sobre o coração. Negligências na guarda do coração.
- Dissipação da mente.
- Perda de vigilância sobre os sentidos do corpo. Distração.
- Falta de cuidado e de prudência. As grandes empresas enviam contra nós os demônios mais potentes. Uma coisa é cair por fragilidade e outra por falta de prudência e por negligência. A fragilidade pode ser útil à humildade; a segunda ao contrário é danosíssima e prejudica a alma.
- Negligência na vida de piedade e no conservar a ordem dos empenhos, negligência no fugir do mundo e de suas preocupações.
- Negligência na oração.
- Desânimo, indolência: descuidar das pequenas faltas e da grande ascese.
- Busca das distrações, nas quais se deixa envolver pelos ilusórios apelos o mundo e se fica vazio da verdade revelada e inspirada. Então surge a falsa luz ou o brilho dos modelos profanos dos seculares.
- Desregramento: viver sem regras, sem escrúpulos, com fraca custódia dos sentidos; expor-se a qualquer encontro.
- Perda do espírito religioso: assumir o espírito do mundo, não participar de retiros espirituais, deixar os empenhos, a dissipação. Deixar-se envolver nas manobras políticas ou nos negócios mundanos.
- Curiosidade.
- Mergulho nos prazeres carnais.
Os acidiosos superam todos os outros pecadores. Diz o provérbio: «a corrupção de quem é ótimo é a pior». Este é o último degrau; porém ainda não chegamos ao fundo. Antes, Deus permite os pecados carnais, como tratamento para curar um mal maior: a soberba. Se também este, em princípio mais oculto, não produzir fruto, então se chega ao fundo, à desobediência. «O ímpio chegando ao fundo, despreza a todos».
Jesus e a Acídia
Há no Evangelho um momento angustiante que nos mostra Jesus numa tremenda situação de tristeza espiritual e depressão. É o Getsémani. Escreve Mateus: «E tomou consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu e começou a sentir tristeza e angústia». Disse-lhes: «A minha alma está triste até a morte; permaneçam aqui e vigiem comigo».
E distanciando-se um pouco, prostrou-se com a face em terra e rezou: «Pai, se é possível, afasta de mim este cálice! Porém não como eu quero, mas como queres tu!» Depois retornou aos discípulos e os encontrou dormindo. E disse a Pedro: «Assim vocês não foram capazes de velar uma só hora comigo? Vigiem e orem para não caírem em tentação».
«O espírito está pronto, mas a carne é fraca».
Algumas considerações: os evangelistas nos mostram um Jesus abatido, "encurvado", à beira de um precipício. O que impressiona é a sinceridade desarmada de Jesus: Ele, o Messias, arrebatador das turbas, Aquele que havia dado esperança a milhares de pessoas, que havia feito milagres, que havia feito sentir o poder e o amor de Deus a todos os desesperados, agora não se envergonha de confessar a Seus discípulos o Seu estado de prostração, a Sua aversão por aquilo que O espera: «A minha alma está triste até a morte».
Ver o seu Mestre naquele estado, com a moral por terra, devia produzir na alma dos discípulos um efeito devastador e de desconforto, paralisante. Mas Jesus não procura esconder, por medo de desiludir, fala, mostra Sua fragilidade humana e pede ajuda.
Que lição! E também Jesus nos exorta a perseverar na oração, ainda quando não se tem vontade, abandonando-se ao desígnio do Pai e de Sua bondade.
A oração é fonte da força para não cair em tentação: a carne é fraca.
Como combater a Acídia?
"Tudo seja feito com honestidade".
Reflitamos sobre a palavra: "honestidade", sobre o agir com honestidade. Há uma honestidade natural, que é agir com retidão, segundo a luz da razão; e uma honestidade sobrenatural, que consiste em agir com retidão, movidos pela luz da fé.
Há uma honestidade do sujeito que age: interior e exterior; e uma honestidade da mesma ação. Agir com honestidade ou retidão implica fazer tudo com espírito verdadeiro, generoso, convicto, vivo, consciente de que as coisas que devem ser executadas com a força do próprio estado são aquelas que Deus quer de vocês e que executando-as estão obedecendo a Ele e cumprindo a Sua vontade.
Esse espírito é indispensável porque é a alma de toda a ação. Sem este se trabalha em vão: "Labutamos a noite inteira e não pegamos nada" (Lc 5,5).
Eu fiz isso, eu fiz aquilo, e não consegui nada! É necessário que cada ação seja orientada por esse espírito. A toda hora digam como aquele Santo: "Dá-me, Senhor, o Teu Espírito".
Você está na escola e o coração em Deus; está na Igreja a serviço e o coração em Deus; canta, senta-se à mesa, passeia, reza, estuda, dorme e o coração em Deus. "O Senhor teu Deus junto de ti é um poderoso salvador. Exultará de alegria por ti, te renovará com Seu amor, se alegrará por ti com gritos de alegria" (Sf 3,17).
Se a sua ação for animada por esse espírito interior de honestidade, não faltará a honestidade exterior, isto é, o decoro, a compostura, a seriedade e aquela modéstia religiosa não afetada, que ajuda muito à edificação do próximo.
Conforme o Concílio de Trento:
Não há nada que arraste fortemente o próximo à piedade e ao culto de Deus, de maneira assídua, quanto a vida e o exemplo daqueles que se dedicam ao ministério divino. De fato, quando as pessoas os veem viver acima das coisas deste mundo, voltam seus olhos sobre eles, como num espelho, e aprendem a imitá-los. Portanto é absolutamente necessário que os clérigos, chamados ao serviço de Deus, tenham vida e comportamento tais que, no modo de vestir, nos gestos, no caminhar, no falar e em todas as outras coisas manifestem uma postura grave, modesta e religiosa. Evitem até as leves transgressões, que neles seriam
enormes, de modo que as suas ações inspirem em todos veneração.
Não basta fazer as coisas como as fazem muitos. É preciso fazê-las bem, com grande precisão, como convém à obra de Deus. "Maldito aquele que cumpre as obras do Senhor com negligência" (Jr 48,10). "Cristo fez bem todas as coisas" (cf. Mc 7, 37).
"Tudo seja feito com ordem".
Ordem em dar prioridade a certos empenhos e ordem em programar o tempo:
• Ordem na prioridade
- Primeiramente servir a Deus e louvá-lo com a Liturgia das Horas, depois qualquer outra coisa;
- Primeiramente a alma, com a meditação e as leituras espirituais, depois o descanso do corpo;
- Primeiramente a perfeição espiritual, depois o estudo.
• Ordem nas ocupações
"Acima de tudo esteja a caridade, que é o vínculo de perfeição" (Col 3,14).
- Primeiramente o estudo obrigatório, depois aquele por deleite pessoal;
- Primeiramente estudar para si mesmo, depois para os outros;
- Primeiramente deve-se aprender, depois ensinar aos outros.
Tantos acólitos desejariam se tornar logo mestres. É preciso elaborar um programa e distribuir com ordem os empenhos. Não se deve fazer as coisas ao acaso. Diz um mestre de espírito: "Fazer as coisas ao acaso é sempre um mal". Um clérigo que vive ao acaso leva uma vida confusa, que facilmente poderá se transformar em má. Oh! Quantos vivem assim!
São Basílio anota:
Pus-me a observar alguns dos nossos e descobri o que são pelas coisas que fazem. Vi, por exemplo, alguns que fazem uma certa coisa não porque é o momento de fazê-la, mas porque eles acham que devam fazê-la naquele momento. Assim, em outra ocasião, em que não estão com o mesmo humor, ou não a fazem ou a fazem de qualquer jeito.
Estes são religiosos que começam o dia sem saber o que devem fazer, e o terminam sem saber o que fizeram. Por isso num dia fazem e no outro não: hoje de um modo e amanhã de outro; uma vez isto e outra vez aquilo; uma vez menos e outra mais; uma vez tudo e outra nada.
Jamais do mesmo modo, sem método ou programa, agem de acordo com sua volubilidade. Neles há superficialidade e dispersão e movidos por um espírito inconstante, agem sem ordem.
Uma regra importante para um clérigo do Senhor é conservar bem organizados os seus empenhos. São Bernardo sugere: "Sejam definidos os tempos e distribuídas convenientemente as horas". É preciso estabelecer um primeiro princípio: cada cristão e, muito mais, cada clérigo devem distribuir as horas do dia, de tal modo que não fique nenhum momento vazio, sem uma ocupação. O tempo é um dom precioso; deve-se fazer bom uso dele, construindo para a vida eterna. Porém vocês não conseguem fazer bom uso, se antes não determinarem os tempos, se não fizerem um horário, um programa do dia. "Sejam definidos os tempos e distribuídas convenientemente horas".
• Fixar o tempo da oração
- Meditação, pela manhã: "De manhã penso em ti" (Sl 63,7);
- Oração vocal: Liturgia das Horas etc. "Sete vezes ao dia eu te louvo" (SI 119,164);
- Leitura da Escritura e dos Documentos da Igreja: "Dedique-se à leitura"(1Tm 4,13).
- Sagrada Escritura, Vidas dos Santos, livros que tratam da vocação eclesiástica ou da perfeição necessária a quem é chamado e dos meios para atingi-la:
- Exame de consciência, toda tarde: "Reflito e o meu espírito vai se interrogando" (SI 77, 7). Examinar-se particularmente sobre o defeito predominante. Além disso: se recitou bem a Liturgia das Horas e as outras orações, se obteve fruto da Eucaristia; se vigiou bem os seus sentimentos; se conservou o espírito da vocação eclesiástica; se suas ocupações e seus descansos foram dignos de um ministro do Senhor.
• Fixar um tempo para o estudo
A Adão, antes do pecado, foi entregue o Paraíso terrestre para que o cultivasse e o guardasse e assim fugisse do ócio e não caísse no pecado.
"O ócio favorece toda maldade, por isso - frisa o Crisóstomo - Deus ordenou a Adão que trabalhasse e guardasse o jardim do Éden".
A vocês Deus estabeleceu que cultivem as suas mentes como um jardim, para que depois possam produzir, por meio da caridade, frutos de ciência úteis ao próximo e agradáveis a Deus.
• Fixar o tempo da recreação
Uma recreação moderada é conveniente a um clérigo: "Filho, usa bem o tempo" (Eclo 4,23); "não se perca nenhuma parte deste bom dom" (Eclo 14,14).
• Fixar um tempo para o sono
Fixar o tempo necessário, não excessivo, para o sono. O sono excessivo provoca a preguiça, o descuido e a pobreza de espírito, que é a pior consequência de todas. Pela manhã, quando se levanta tarde, se sente fraco durante o dia, sem vigor, sem força e à tarde se constata, com pesar, que se perdeu toda a jornada, que não se fez nada. Eis a pobreza de espírito que brota do prazer de ficar na cama.
Deus mandava o maná, de cada dia, antes do sol e quando o sol começava a esquentar o maná se derretia (cf. Ex 16,21).
• "Tudo seja feito".
Não nos contentemos em ter conhecido belos projetos ou tê-los na cabeça; também não nos basta nem mesmo um lindo programa escrito.
É preciso haver obra, isto é, o programa deve se tornar vida vivida.
Quem, pois, quer se convencer das verdades ouvidas (escreve São Gregório Magno) se apresse em transformar em obras aquilo de que seu intelecto já teve conhecimento. Os discípulos de Emaús receberam de fato a luz, não tanto escutando a Palavra, mas no momento de praticá-la, quando hospedaram Jesus.
Não confiemos apenas em bons desejos. São necessários fatos!
Fatos! "Procurem, pois, irmãos tornar sempre mais firmes a sua vocação e a sua escolha" (2 Pd 1,10).
Terapia para acabar com a Acídia:
• "Fugir dos pequenos pecados. Quem despreza as pequenas coisas, logo cairá. São como ladrõezinhos que entram pela janela, para abrir a porta aos grandes ladrões" (Memorial Privado).
• Viver na presença de Deus. O que fizeres e onde estiveres: tenhas o coração em Deus!
• Respeitar a prioridade dos valores.
• Fixar o programa do dia.
• Fazer com diligência o exame de consciência.
Dos escritos de São Gaspar Bertoni
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