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A Virtude da Prudência - Parte 3

Foto do escritor: Cidade RadioCidade Radio

VI. OS MEIOS MAIS NECESSÁRIOS


1. A mais necessária das prudências


Ao falar, no capítulo anterior, da responsabilidade de preparar os "meios" adequados para alcançar o fim que se deseja, frisávamos que o principal "meio" é a própria pessoa que age.


Neste capítulo vamos considerar algumas qualidades essenciais relativas ao preparo da pessoa em si, não só ao preparo especializado dela para determinadas ações, responsabilidades ou tarefas: para ser pai, ser administrador, etc.


Tomemos como ponto de partida um "caso" simplificado. João foi o melhor aluno da melhor faculdade do país. Fez pós graduação com a máxima qualificação. Mestrado e

doutorado em Harvard. Volta à sua cidade, com essas credenciais e logo consegue

emprego numa grande firma. Mas já no segundo mês, diretores, gerentes e colegas

começam a sentir-se mal junto dele. A sua arrogância humilha. Companheirismo, zero.

Seu desprezo pelas opiniões dos colegas e auxiliares torna o trabalho um inferno.

Convencido da sua importância, sente-se no direito de irar-se, vive dando broncas, ofende e produz contínuos conflitos, que acabam explodindo na diretoria. Não precisa dizer que, se não se corrige, não haverá empresa que o aguente, e os pomposos títulos só servirão para serem pendurados na parede como decoração.


É um caso simplificado, dizia, mas serve para evidenciar que nem as qualificações acadêmicas, nem as capacitações técnicas, nem um alto grau de especialização e

experiência setorial definem o "valor humano" de uma pessoa. Ela poderá até chegar ao

pináculo da sua "especialidade", mas fracassará na "vida" como ser humano.


Uma faca enferrujada pode servir para furar bem ou mal uma caixa de papelão,

mas não serve para uma cirurgia cardíaca de que depende uma vida.


Vejamos, então, alguns aspetos que temos de trabalhar para não sermos faca enferrujada. Por outras palavras, que condições pessoais precisamos ter para sermos prudentes em todas as circunstâncias.


Focalizaremos quatro dessas condições, sendo que as duas primeiras são pilares insubstituíveis.


2. Sermos pessoa de critério


Têm critério as pessoas que adquiriram formação e lucidez suficientes para captar com facilidade o que está certo e o que está errado. Não só do ponto de vista moral (importante para o juízo da consciência), mas de todos os pontos de vista práticos:


- Isto vai ajudar ou prejudicar?

- Isto é o que a pessoa precisa ou vai lhe atrapalhar?

- Isto educa os alunos ou os desorienta?

- Este é um bom plano ou é uma confusão insensata?

- Isto será um fator de crescimento, ou de complicação?

- Qual será a repercussão pessoal, familiar ou social de tal ou qual decisão minha?


No nível profissional, todos conhecemos pessoas de critério: um médico experiente dotado de um olho clínico perspicaz, um advogado que percebe ao primeiro golpe de vista qual será a melhor solução, um engenheiro que vê logo que um arco está mal calculado.


São pessoas em quem se confia e às quais se recorre com segurança, gente que têm a prudência enriquecida por um "aditivo" especial, que Santo Tomás chama solertia (não confundir com a equivalente palavra portuguesa), que é a capacidade de enxergar logo, intuitivamente - sobretudo em situações inesperadas - , os problemas objetivos e as melhores soluções.


- A primeira coisa que é preciso dizer é que o critério não nasce connosco, como a inteligência, nem se obtém por inspiração angélica. Ganha-se com "labor e suor" (in

labore et sudore). Não é lícito, como dizia cruamente alguém, refugiar-se na estúpida suficiência de um saber fictício. A presunção do ignorante que pontifica e dá palpite sobre

aquilo que não conhece, além de ridícula, é o polo oposto da prudência.


Convença-se - quero insistir-lhe - de que não basta ter boa intenção, bom coração e boa vontade, unidos a um bom preparo técnico, para enfrentar prudentemente os desafios da vida. Só poderá ganhar bom critério a pessoa que se esforçar seriamente - com perseverança diária - em aprimorar a sua formação, especialmente a sua formação

cristã, nas questões doutrinais, morais e espirituais.


Hoje, quem quiser pode encontrar muitas obras e outros meios valiosos que - sob a orientação de conselheiros experientes - podem enriquecer constantemente a nossa formação.


Concretamente, quando se trata de um cristão, a aquisição de critério exige necessariamente:


- Ter doutrina. Conhecer em nível suficientemente elevado (para um adulto, não basta o catecismo das crianças) o ensinamento de Cristo e a doutrina da Igreja. Décadas atrás, talvez bastasse o clima familiar para transmitir critérios cristãos certos. Atualmente, não. Cada um tem que se empenhar em adquiri-los, como aquele comerciante, de que Cristo fala, que procurava uma pérola preciosa e não parou até consegui-la (Mt 13, 45-46).


- Ter sinceridade de vida. Quer dizer, fazer o esforço de adequar a conduta à fé.

Se não há vivência, é impossível adquirir a "sabedoria do coração", um outro nome que o

Livro dos Provérbios dá à prudência (Pr 16,21). Só as verdades encarnadas na prática são

luminosas, tanto para a nossa vida como para a dos outros.


- Viver em graça de Deus. Usar habitualmente os meios de que dispõe o cristão para adquirir a graça do Espírito Santo, e para recuperá-la, se a perdeu: os Sacramentos da Confissão e da Eucaristia, a oração, o amor a Deus e ao próximo com que se realizam,

com a maior perfeição possível, os deveres que tecem a vida diária.


Quando há esse empenho de autenticidade, os dons do Espírito Santo colocam-nos facilmente diante da Luz de Deus, sobretudo o dom de Conselho, que «julga, nos casos particulares, o que convém fazer em ordem ao fim sobrenatural (à santificação e à salvação eterna)».


3. Cultivar as virtudes humanas e cristãs


«Persuadi-vos - escreve São Josemaria - de que um cristão, se de verdade pretende conduzir-se retamente diante de Deus e diante dos homens, precisa de todas as virtudes, pelo menos em potência».


Tenhamos presente o que dizia o Pe. António Vieira: «Os olhos veem pelo coração; e assim como quem vê por vidros de diversas cores, todas as coisas lhe parecem daquela cor, assim as vistas se tingem dos mesmos humores de que estão bem ou mal afetos os corações».


Onde o Pe. Vieira diz "humores", coloquemos "vícios", que são o contrário das virtudes. Para alcançar a clareza do olhar, do julgamento de que a prudência precisa (Mt 6, 22-23), é necessário limpar esses "humores", e eles só se limpam com a luta pelas virtudes, ajudados pela graça de Deus.


- Em primeiro lugar - porque têm uma função básica -, precisamos esforçar-nos

por cultivar as virtudes humanas já mencionadas antes, ou seja as "virtudes morais":

prudência, justiça, fortaleza, temperança... e as outras virtudes ligadas a elas. Essas virtudes já foram comparadas à estrutura óssea de um corpo. Sem ela, o corpo se esparramaria no chão como uma ameba. Pois bem, sem virtudes, só pode haver homens e mulheres "amebas", incapazes de segurar a direção prudente da vida.


- Não duvide de que as quatro virtudes cardeais são inseparáveis. Sem fortaleza, não há autodomínio, quer dizer, não há temperança. Essa moleza impede também que a prudência utilize, com constância e firmeza, os "meios". Por sua vez, a falta de temperança nos prazeres corporais, ofusca a mente e escurece a prudência, e também enfraquece a vontade desfibrando assim a fortaleza. Finalmente, sem justiça a alma se corrompe e confunde o certo com o errado; deixa de ter, então, um norte que lhe oriente a prudência.


- Acima das virtudes humanas, e vivificando-as todas, estão as virtudes teologais: fé, esperança e caridade. Essas três virtudes, diz o Catecismo da Igreja, «informam e

vivificam todas as virtudes morais» (n. 1813). Elas criam a abóbada luminosa onde a

prudência é guiada com segurança pela "estrela" de Deus, como na história dos Magos.


- Quando a alma vive sob o influxo dessa constelação de virtudes - teologais e morais -, os valores da vida se enxergam de uma forma mais alta, e a prudência, que agora já é "prudência sobrenatural", toma rumos bem mais elevados.


Vale a pena recordar uma cena evangélica, que fala da vida de um jovem, que fracassou pela falta de prudência sobrenatural.


O Evangelho nos mostra um rapaz idealista e impetuoso. Empolgado, ao ver e ouvir Jesus, correu ao encontro Dele e se lhe jogou aos pés dizendo: Bom Mestre, que devo fazer para ganhar a vida eterna? Queria estar com Deus, muito perto de Deus e para sempre. Jesus indicou-lhe o caminho dos dez Mandamentos da Lei de Deus.

Satisfeito, o jovem respondeu: Eu os tenho observado desde a minha adolescência.


Jesus então - diz São Marcos - olhou para ele com carinho, e lançou-lhe um apelo:

Ainda te falta uma coisa. O que faltava era largar tudo e segui-lo, como fizeram Pedro, João, Mateus, Tiago.... Mal ouviu o apelo da vocação, o jovem ficou pesaroso e foi embora cheio de tristeza, pois possuía muitos bens. Ficou com o seu dinheiro e a sua tristeza, talvez para sempre... (Mc 10, 17-22).


Fez uma inversão de valores. Mais do que acolher o amor de Deus e o privilégio da vocação divina, preferiu aconchegar-se nos seus bens materiais, no dinheiro. Bem dizia Jesus que ninguém pode servir a dois senhores... Não podeis servir a Deus e à riqueza (Mt 6, 24).


4. Duas virtudes auxiliares


Há uma série de virtudes que Santo Tomás chama "partes integrantes" da prudência, porque só com elas a prudência funciona bem. Vamos considerar duas delas:


- A docilitas (palavra ligada ao verbo latino docere, ensinar).


«A prudência - diz o santo doutor - refere-se às ações particulares, nas quais a diversidade é quase infinita. Não é possível que um só homem seja plenamente informado de tudo o que a isso se refere, nem em um curto tempo, senão em um longo tempo. Por isso, no que se refere à prudência, em grande parte o homem tem necessidade de ser instruído por outros».


Docilitas é a arte de consultar a quem pode aconselhar-nos - como lembrávamos acima -, e de acolher os seus conselhos e sugestões de mente aberta, com ponderação e sem preconceitos.


Como é difícil a arte de "escutar". Passamos grande parte da vida escutando-nos a nós mesmos. Ao fazer isso, substituímos a razão objetiva pela subjetividade dos nossos desejos, caprichos e vontades. É lógico que, assim, muitos "juízos" e "decisões" pessoais saiam deturpados.


É próprio do prudente consultar e escutar. Pelo contrário o vaidoso fala, fala, fala, impõe seus pontos de vista, nem que seja na base de gritar mais alto do que os outros.

Assim impossibilita o diálogo, ignora a troca enriquecedora de pareceres. Quem não sabe

ouvir se empobrece. Isso é muito ruim na família, é ruim entre amigos, é ruim na empresa, é ruim no esporte, é ruim na Igreja ...


- A previdência. É outra "parte integrante" da prudência. Dela, Santo Tomás afirma, entre outras coisas: «Deve-se dizer que todas as vezes que muitas coisas são requeridas para uma ação, uma delas é necessariamente a principal à qual todas as outras se subordinam».


No mundo atual, é normal estar envolvido em muitas coisas, numa complexidade de ocupações e deveres. É necessário ordená-los. Não permitir que o secundário ocupe o

lugar do principal, ou que o nosso tempo se organize de forma a deixar de lado os deveres primordiais.


Para mencionar um exemplo comum, lembre-se do grande número de pais e mães

que, pela dedicação "desordenada" (ou seja, não necessária nem inevitável) ao trabalho

profissional, não deixam espaço para o convívio familiar, não acham tempo para a

conversa entre mulher e marido, nem para o diálogo e a vida compartilhada com os

filhos.


Isso tudo é uma desordem na hierarquia de valores. Uma imprudência séria, que -

por falha na formação da consciência moral - é praticada por muitos como a coisa mais

natural do mundo.


O prudente decide sobre os fins e os meios mantendo a ordem de importâncias: ao que é primeiro, deve dedicar-se a melhor atenção e empenho, ainda que não se lhe possa dedicar o maior tempo.


Quer uma ordem hierárquica clara?


- primeiro, Deus (e os mais necessitados, espiritual e corporalmente, que Jesus identifica consigo: (Mt 25, 40).


- segundo, a família, a "começar" pela mútua dedicação do casal.


- terceiro, os deveres profissionais e sociais, e a responsabilidade pelo bem comum.


Dissemos desde o começo que a pessoa prudente tem que decidir quais os fins certos e os meios adequados que deve escolher. Falta-nos apenas refletir sobre a ação, sobre a decisão de agir, de pôr em prática esses meios. É o que veremos nos próximos capítulos.


VII. TERCEIRA ETAPA: A DECISÃO


1- A etapa "definitiva" da prudência


Até aqui acompanhamos dois elementos necessários para a virtude da prudência:


- a reflexão (não agir sem antes ter pensado devidamente) e o juízo (ter julgado ponderadamente acerca dos valores e dos meios a empregar). São dois passos

importantes da prudência: conforme o caso, podem ser praticados em poucos segundos,

em horas, ou em dias e até mesmo em anos. Mas são necessários para o momento decisivo, que é a hora de agir com prudência, a "hora da verdade".


Neste sentido, Santo Tomás ensina que «ato principal» da prudência é «comandar, que consiste em aplicar o conhecimento ao desejo e à ação». Comandar é determinar-se a agir. Por isso, Josef Pieper pode afirmar que a prudência é «a perfeita capacidade de decisão em função da realidade».


Essa decisão leva o processo da prudência à perfeição. Por isso se diz que a prudência é a virtude característica do governante. «Onde se encontra uma razão especial de direção e de comando nos atos humanos, haverá também uma razão especial de prudência... Por isso se considera a ciência de governo uma espécie de prudência».


Vale a pena meditar sobre isso porque frequentemente se cometem graves imprudências por faltas de decisão (no governo da família, de qualquer comunidade, de um país, etc.).


Vejamos algumas modalidades do vício da "indecisão". Todas elas, evidentemente, são manifestações de fraqueza moral.


2. A hesitação


A vida não é um jogo matemático, no qual todos os elementos e variáveis possam se meter numa tabela ou num computador para obter o resultado infalível.


Não sei se leu ou ouviu dizer que um computador sofisticado da IBM, o Deep blue, acabou vencendo, em 1997, Garry Kasparov, talvez o maior enxadrista de todos os tempos.


Acontece, porém, que não existe o computador do namoro, nem o computador da fidelidade conjugal, nem o computador do amor ao próximo, nem o da vocação cristã,

nem sequer o do sucesso de uma missão política ou militar, ou de uma simples microempresa comercial.


Se esse computador existisse, muito teria ajudado Flora, a jovem do romance Esaú e Jacó de Machado de Assis. Flora, a eterna hesitante, morreu sem se haver decidido por nenhum dos dois gêmeos, Pedro ou Paulo, que a cortejavam. Pela sua fraqueza de caráter, se morresse aos noventa anos, seria enterrada ainda indecisa.


Com perdão pela comparação, pessoas assim vivem uma história análoga à experiência feita por alguns biólogos há tempos: encerrar um cachorro em um cubículo em frente a duas tigelas atulhadas de boa comida, uma à direita e outra à esquerda. Que aconteceu? Diante dos dois banquetes tentadores, o cão morreu de fome antes de engolir um bocado. São as pessoas do famoso «nem sim nem não, antes muito pelo contrário».


Às vezes custa decidir, porque isso significa inevitavelmente excluir. Se você decide casar-se com tal pessoa, exclui todas as outras. Aquele que decide alistar-se como voluntário na força de paz da ONU exclui continuar na tranquilidade do lar. Não se pode jogar baralho mantendo todas as cartas na mão. Algumas delas, por vezes a maioria, têm que ser descartadas.


2. O medo


Outras vezes, para nos decidirmos a algo que valha a pena, precisamos ultrapassar a barreira do medo.


- Medo de que não dê certo. Medo dos imprevistos. Medo das dificuldades.

Medo de não ser capaz. Se você não vencer esse medo, nunca fará nada.


A decisão exige "lançar-se" a fazer, sabendo que nada na vida está absolutamente

garantido e sempre podem surgir surpresas ou imprevistos. Sem essa coragem de

começar, de empreender, de arriscar, nunca faríamos nada que valesse a pena... e nem

sequer enfrentaríamos as dificuldades do cotidiano. Não iríamos de carro, porque poderia

haver um acidente, não desceríamos uma escada porque poderíamos escorregar e quebrar o pescoço...


Shakespeare mostra-nos Hamlet monologando sobre a sua própria reflexão indecisa: ele reconhece que se dedica a «pensar nas consequências com excessiva minúcia», e acaba confessando: «Reflexão esta que, de quatro partes, tem uma só de prudência e sempre três de covardia».


Aos que se sintam indecisos por esse tipo de medos, aconselharia ler os relatos das diversas viagens de Amyr Klink. Impressiona a seriedade - a prudência! - com que preparou em cada caso o barco, os alimentos, as rotas, o clima, o estudo das correntes marítimas, as experiências dos exploradores mais qualificados, e tantos detalhes mais.


Quando chegou a hora em que, com tudo suficientemente preparado, tinha que

partir, partiu. E não recuou no meio da travessia. Assim se inscreveu entre os grandes

dessas aventuras imortais (Amundsen, Shackleton...). Bem conhecidos são alguns

conselhos dele, que são verdadeiras máximas de prudência:


- «Para se chegar, onde quer que seja, é preciso, antes de mais nada, querer».

- «O pior naufrágio é não partir».


Medite também estas outras considerações de São Josemaria:


«Pela prudência, o homem é audaz, sem insensatez. Não evita, por ocultas razões de comodismo, o esforço necessário (...). Não atua com tresloucada precipitação ou com

absurda temeridade, mas assume o risco das suas decisões e não renuncia a conseguir o

bem por medo de não acertar».


3. O falso querer


A prudência pode perder-se pela fragilidade do querer. É o caso das pessoas que querem, dizem que querem, mas falta-lhes caráter e convicção.


Tranquilizam a consciência pensando que, na verdade, "estão querendo sinceramente" (dedicar-se muito mais aos filhos, preparar um concurso difícil, assumir um compromisso de serviço à comunidade, resolver longas dúvidas sobre a vocação), mas na realidade não querem, só "gostariam de"...


São os que alguém chamava "os suicidas do condicional". "Eu gostaria muito de

recomeçar a minha vida cristã: assisti a um filme sobre padre Pio e chorei", "Eu gostaria

tanto de fazer juntamente com a esposa um curso de orientação familiar do IOF, me

falaram que é ótimo... Vamos ver se no ano que vem vai dar, quem sabe...".


Mil desculpas de pura moleza ou preguiça levam a não resolver. Os desejos matam

o preguiçoso, diz o Livro dos Provérbios (21, 25). Morre no pântano do condicional.


Para esses São Josemaria escrevia: «Um querer sem querer é o teu... - Não queiras iludir-te dizendo-me que és fraco. És ... covarde, o que não é o mesmo» (Caminho, n.714).


Em contraste com os moles inoperantes, penso em Santa Teresa de Ávila. Uma mulher de fraca saúde e com uma vida cheia de incompreensões, perseguições e obstáculos aparentemente invencíveis. Tinha orado, meditado e se aconselhado muito; por isso estava certa do que Deus lhe pedia. E em poucos anos realizou - com a fundação de um grande número de mosteiros de carmelitas descalças - o que raríssimos homens e mulheres de empresa conseguem durante a vida. Um trabalho, um serviço, que continua a dar frutos vigorosos e saborosos em todo o mundo.


A importância de um querer sincero atinge o grau máximo quando se trata de decisões das quais depende o sentido profundo da existência (o ideal, a fé, a vocação cristã, a fidelidade, o amor, a família).


Pensando nisso, peço-lhe que medite devagar (sinceramente!) este ponto de Caminho: «Dizes que sim, que queres. - Está bem. - Mas... queres como um avaro quer o seu ouro, como uma mãe quer ao seu filho, como um ambicioso quer as honras, ou como um pobre sensual quer o seu prazer? - Não? Então não queres» (n. 316).


4. A negligência


Santo Tomás, ao tratar sobre a prudência, na Suma Teológica, dedica alguns capítulos ("artigos") à negligência.


«A negligência - diz - implica a falta da solicitude devida... Procede de um certo relaxamento da vontade, que faz com que não se estimule o raciocínio para que dele surja a determinação de fazer o que se deve e do modo devido».


-"Solicitude" significa zelo, empenho por atingir um objetivo. Para isso, é preciso haja um querer, um ideal que aqueça a alma e a mantenha desperta. O negligente não tem nada disso, nem metas de superação nem verdadeiros ideais. Só pensa com imediatismo, só fala em lugares comuns, só comenta festas, campeonatos, jogos, aventuras efêmeras, experiências etílicas e "viagens"...


Em suma, a negligência identifica-se com a frivolidade, um dos grandes inimigos da prudência. É um defeito característico das pessoas vazias por dentro: caprichosas, inconstantes de pensamento e de caráter, passivas, avoadas, volúveis, distraídas... Têm a

consistência de uma bolha de sabão, embora apresentem às vezes, como a bolha, brilhos

irisados.


São Josemaria alerta vigorosamente contra essa perigosa imprudência: «Não caias nessa doença do caráter que tem por sintomas a falta de firmeza para tudo, a leviandade no agir e no dizer, o estouvamento..., a frivolidade, numa palavra. - Essa frivolidade, que - não o esqueças - torna os teus planos de cada dia tão vazios ("tão cheios de vazio"), se não reages a tempo - não amanhã; agora! - fará da tua vida um boneco de trapos morto e inútil».(Caminho, n. 17).


E, quando se trata da vida espiritual cristã, o mesmo santo faz um diagnóstico preciso, sobre o qual você fará bem de se examinar ponto por ponto: «És tíbio se fazes preguiçosamente e de má vontade as coisas que se referem ao Senhor; se procuras com cálculo ou "manha" o modo de diminuir os teus deveres; se só pensas em ti e na tua comodidade; se as tuas conversas são ociosas e vãs; se não aborreces o pecado venial; se ages por motivos humanos (sem pensar em Deus)» (Caminho, n. 331).


5. O vício de protelar


Há pessoas que padecem de um tipo especializado de negligência: postergar tudo o máximo possível. Não sei se o fazem de propósito ou como efeito da compulsão de sua

irresponsabilidade.


Chegam esbaforidos ao aeroporto e apanham o avião na última chamada, ou simplesmente o perdem. Atrasam renovar a carteira de motorista, com risco de apanhar a correspondente multa ou sanção. A mesma coisa com o passaporte. Perdem outros prazos, com consequências jurídicas e monetárias lamentáveis. E se afobam quando já não dá tempo.


É importante compreender que a verdadeira prudência exige decisões prontas.


Santo Tomás, reportando-se a Aristóteles afirma: «É preciso deliberar calmamente, mas pôr prontamente em ação aquilo que antes foi deliberado e julgado».


Façamos um balanço. Quantos bons projetos e propósitos nossos acabaram inutilizados, mofando no quarto de despejo da vida, por falta de prontidão, porque "chegamos tarde". Fomos adiando-os, sem razões de peso e com pesada leviandade, e depois ficamos chorando a frustração daquilo que poderíamos e deveríamos ter feito.

Quantas páginas da nossa vida ficaram em branco, e nos sussurram no fundo da consciência aquelas palavras de Cristo: Servidor mau e preguiçoso, devias... (Mt 25, 27).


«A prudência exige habitualmente uma determinação pronta e oportuna - ouçamos de novo São Josemaria - . Se algumas vezes é prudente adiar a decisão até que se completem todos os elementos de juízo, outras seria uma grande imprudência não começar a pôr em prática, quanto antes, aquilo que vemos ser necessário fazer, especialmente quando está em jogo o bem dos outros».


Continua na última parte...





 
 
 

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